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Novo aeroporto já provoca polêmica sem sair do papel

Especialistas defendem modernização e ligação por trem entre Congonhas, Cumbica e Viracopos

Daniela Chiaretti – Valor Online

A construção de um novo aeroporto na região metropolitana de São Paulo, anunciada sexta-feira pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, encontra resistência já na fase de intenção de fazer a obra, um investimento estimado em R$ 5 bilhões e que pode ficar pronto, nas estimativas do governo federal, em seis anos.

Nos 39 municípios da Grande São Paulo, o adensamento urbano é intenso, há regiões de mananciais, a topografia é inadequada ou existem áreas de proteção ambiental, uma conjunção de fatores que complicaria a construção de um empreendimento de porte. O melhor, apontam urbanistas e ambientalistas, é terminar o que já está aí. Ou seja, concluir o aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, modernizar Viracopos, em Campinas, e trabalhar na logística para que passageiros possam chegar e sair de ambos sem enfrentar os congestionamentos imprevisíveis das vias de acesso.

Na melhor das hipóteses, com um Estudo de Impacto Ambiental bem feito, um novo aeroporto na região levaria um ano para ser licenciado; na pior, e mais provável, quatro anos, o tempo que demorou para outra obra controversa, o Rodoanel Mario Covas, conseguir o sinal verde ambiental. No caso da interligação de várias rodovias que desembocam na capital paulista, o Rodoanel, ocorreram dezenas de audiências públicas e vários questionamentos do Ministério Público. O rito de um novo aeroporto na região, que também deverá ser licenciado pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente, a SMA, (embora os locais em estudo não tenham sido divulgados), não deve ser diferente, avaliam especialistas.

"Um aeroporto não é um puxadinho que se faz em casa", diz uma fonte do setor ambiental. "É um projeto complicado, que requer estudos estratégicos e que nunca vem sozinho. Dependendo do lugar escolhido, é bem complicado", prossegue. "Quando se conversa com a Infraero, parece que um aeroporto flutua no ar. Que existe e independe do entorno."

O entorno se traduz num grande fluxo de pessoas no momento da construção, eventuais desapropriações, indústrias e serviços de suporte que se aproximam, estradas e trânsito. O ruído é o primeiro impacto ambiental, seguido da emissão dos gases das aeronaves e dos efluentes da estrutura do aeroporto. Depois surgem os efeitos colaterais: Cumbica já usa água de sete poços subterrâneos e a ampliação demandará mais dois.

"Na minha opinião, é um absurdo", diz a arquiteta urbanista Regina Monteiro, conselheira do Movimento Defenda São Paulo, ONG que há anos alerta a Infraero e a prefeitura de São Paulo sobre os impactos de Congonhas. A curto prazo, defende, é preciso otimizar a infra-estrutura aeroportuária existente. "Viracopos é um ótimo aeroporto, e esta lá, largado", diz Regina. "Já ouvi falar em Jundiaí, em São Caetano, mas o que adianta? A nossa incompetência para chegar a Guarulhos é evidente. Basta um motoqueiro cair na marginal ou o Tietê encher que se perde o avião."

Ela enumera problemas já evidentes nos aeroportos que existem, e que, defende, deveriam ser solucionados antes de se pensar em outra obra: da carência tecnológica para evitar que rádios-pirata interfiram na comunicação entre torre e pilotos até a linha de alta tensão próxima ao aeroporto, no caso de Congonhas. Da falta de trens e metrô para levar os passageiros a Cumbica ou Viracopos ("existem diversos estudos sobre isso, há anos", lembra), às 20 mil pessoas que ocuparam a área da Infraero, onde se deveria construir a terceira pista do aeroporto de Guarulhos. "A legislação ambiental, fundamental, é cada vez mais restritiva", continua Regina. "Não se consegue fazer uma hidrelétrica em Rondônia, imagine um aeroporto na Grande São Paulo!".

Nesta região de quase 8 milhões de km2, onde vivem 20 milhões de pessoas, espaços vazios para abrigar um novo aeroporto são poucos, dizem os técnicos. Na cidade de São Paulo não há lugar nem para novos aterros sanitários. Em zonas não ocupadas da região, estão a Serra do Mar eu a da Cantareira, o que torna a topografia um "mar de colinas", dizem os geólogos. Do lado leste, onde estão Salesópolis, Biritiba-Mirim e Mogi das Cruzes, ficam as nascentes do rio Tietê.

Na zona norte, está o Parque da Cantareira, com os reservatórios de água da cidade. Caieiras, Franco da Rocha e Francisco Morato, mais acima, têm relevo acidentado. A sudoeste, Juquitiba, São Lourenço, Embu-Guaçu e Itapecerica possuem unidades de conservação e mananciais. Taboão da Serra e Embu, a oeste, viveram forte ocupação e já sofrem com a desorganização urbana. "No Estado tem espaço, mas vai colocar um novo aeroporto onde? No Pontal do Paranapanema?", pergunta um técnico, referindo-se ao extremo ocidental de São Paulo.

O advogado Heitor Marzagão Tommasini, diretor executivo interino da Defenda São Paulo e membro do Consema, o conselho estadual ambiental (onde representa entidades ambientalistas da região metropolitana), lembra outro agravante: os espaços remanescentes para construção de um aeroporto estão no cinturão verde da região. O tal entorno verde é tombado pela Unesco e considerado reserva da biosfera. Funciona para permitir que Cotia produza hortaliças, as águas da Cantareira sejam preservadas e até para regular o clima da região.

"A construção de um novo aeroporto é incompatível com a quantidade de problemas ambientais da área metropolitana", opina. "Chegamos a uma situação difícil, onde o custo dos investimentos é enorme. Alterar a lógica das prioridades governamentais é o grande desafio."

"Fazer um aeroporto nas imediações de São Paulo será um desafio enorme", pondera o físico José Goldemberg, que deixou a pasta do Meio Ambiente na gestão passada. "Seria muito mais prático viabilizar com trem rápido as ligações que já existem, de Viracopos e Cumbica."

É a mesma visão de outro ex-secretário estadual do Meio Ambiente, o urbanista Jorge Wilheim:

"Não vejo muita urgência de se pensar em um novo aeroporto quando não esgotamos a construção de Guarulhos". Ali, lembra, falta completar a terceira pista e outros dois terminais de passageiros. "É obra muito grande, acho prematuro pensar nisso agora", continua Wilheim. "É preciso tomar decisões e que cada um faça a sua parte, os três níveis de governo", recomenda.

Estudos para trens já existem, mas em 12 anos de governo PSDB ainda não decolaram. Murilo Celso de Campos Pinheiro, presidente do Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo, entidade com 50 mil associados, lembra do espaço deixado no meio da rodovia dos Bandeirantes, para abrigar uma linha férrea entre Campinas e São Paulo, que está engavetado. "Porque os governos federal, estadual e municipais não se unem e fazem o trem até Viracopos, o metrô até Cumbica?", pergunta. Em Congonhas, defende, precisa ajustar as pistas, fazer as ranhuras, o escape tem que ser pensado, assim como o tamanho das aeronaves, e transferir vôos para outros Estados.

"É sempre a mesma história", diz Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da Terra-Amazônia Brasileira. "Por que sempre um megaprojeto? Por que não se racionaliza antes a infra-estrutura existente, com prazos e condições viáveis e menos transtornos para os usuários e a economia do país?"

Até agora, a SMA analisa os estudos de impacto ambiental de uma base aérea que será transformada em aeroporto no Guarujá e das ampliações do de Ribeirão Preto e Cumbica.

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