Fontes ligadas à investigação do acidente que matou 154 suspeitam de curto-circuito.

Especialista culpa pilotos por ignorarem flaps


Rodrigo Craveiro

Aos poucos, os peritos começam a ter uma idéia do que levou o avião MD-82 da Spanair a se espatifar no solo, matando 154 pessoas em Madri, no último dia 20 de agosto. Uma análise das caixas-pretas indicou que os pilotos não acionaram os flaps durante a decolagem — a peça é fundamental para a estabilização da aeronave na subida. O gravador de dados de vôo mostrou que o avião se manteve em aceleração máxima por algum tempo após tocar a pista do Aeroporto Internacional de Barajas. Está descartada a hipótese de pane nos motores Pratt & Whitney JT8D: localizados na parte traseira do aparelho, eles funcionavam normalmente.

Diretores da Boeing, empresa que adquiriu a McDonnell Douglas em 1997, se negaram a fazer comentários e entregaram o inquérito à Espanha.

Fontes consultadas pelo Wall Street Journal acrescentaram, sob a condição de anonimato, que não havia sinais de fogo antes do impacto. De acordo com elas, o suposto mal funcionamento do sistema elétrico impediu os tripulantes de receber um alerta sobre o risco de decolar com os flaps desativados. Segundo pessoas próximas às investigações, um curto-circuito antes do vôo pode ter impedido que o alarme sonoro tocasse na decolagem.

Dúvidas

Em entrevista ao Correio, o norte-americano William “Bill” Waldock, especialista em segurança em aviação pela Universidade Aeronáutica Embry-Riddle (no Arizona), disse considerar improváveis falhas mecânicas e elétricas. Ele lembra que, em 1987, um MD-8 da Northwest caiu durante a decolagem em Detroit, depois que os pilotos não baixaram os flaps, peças móveis dispostas na asa que nivelam a subida e diminuem a velocidade do vento. “O sistema de alarme não foi ativado naquele caso e tanto o comandante como o co-piloto ignoraram sinais de que os flaps não estavam acionados, o que causou 155 mortes”, afirmou.

Sobre o acidente, Waldock levanta dúvidas. De acordo com ele, se a tripulação sabia que os flaps estavam desativados, o comandante e o co-piloto nunca poderiam decolar. “O sistema de alarme dos flaps deveria ser acionado (buzina e luz), uma vez que o MD-82 tinha iniciado a subida. Pelos relatos que recebi, isso não ocorreu”, explica o norte-americano.

Processo contra Boeing

O escritório de advocacia norte-americano Ribbeck Law entrou com um processo contra a Boeing — proprietária da McDonnell Douglas —, em favor de três famílias que perderam sete de seus membros no acidente aéreo em Madri. “Desde 16 de setembro de 2007, três aviões do mesmo modelo da série MD-80 caíram”, afirmou Manuel von Ribbeck, fundador do escritório. A ação já é qualificada de “demanda multimiolionária”. Von Ribbeck exige que a Boeing torne públicas todas as provas sobre o desastre de 20 de agosto.

Falta de disciplina

William Waldock suspeita de um erro humano no desastre com o vôo JK5022, que também matou o brasileiro Ronaldo Gomes da Silva. “Os pilotos provavelmente aceitaram o risco, ao conduzirem o avião mesmo com um sistema crítico inoperante, além de terem calculado mal a velocidade do vento durante a decolagem”, comenta o norte-americano. Para o especialista em segurança aeronáutica, o desastre pode ter sido fruto de uma falha provocada por uma série de fatores: rotina, complacência, não checagem de procedimentos de vôo na cabine e falta de disciplina no cockpit.

Segundo o Wall Street Journal, “a posição incomum do avião e o movimento rotatório das asas descrito por testemunhas, coincidem com as características de uma decolagem sem flaps”. Um piloto aposentado familarizado com a estrutura elétrica da aeronave MD-80 sustentou que “um problema no sensor de alarme dos flaps poderia ter sido um sinal de que problemas afetavam outros circuitos elétricos”.

Outro especialista que não quis se identificar explicou ao WSJ que a buzina automática do alerta provavelmente não funcionou porque circuitos lógicos da aeronave enviaram sinais errados de que o MD-82 já estava em pleno vôo.

Apesar de não descartar essa tese, William Waldock faz questão de responsabilizar o comandante e o co-piloto. “Se a tripulação tentou acionar os flaps e o sistema não respondeu, os dois terian tempo suficiente para descobrir a anomalia e abortar a decolagem”, disse. (RC)

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