Bruno Tavares
A macrotextura do asfalto do Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, estava abaixo do padrão mínimo de segurança no dia em que o Airbus A320 da TAM varou a pista principal, matando 199 pessoas. A conclusão consta do laudo feito pela Diretoria de Engenharia da Aeronáutica (Direng), que esquadrinhou os 1.940 metros da pista nos dias seguintes ao desastre. O teor do documento dos militares é semelhante ao do Instituto Nacional de Criminalística, da Polícia Federal. A maior tragédia da aviação civil brasileira completa um ano na quinta-feira.
Pelo laudo da Direng, a macrotextura (rugosidade que facilita o escoamento de água) da pista tinha, em média, 0,35 milímetro. O mínimo estipulado pela norma IAC 4.302, editada pelo extinto Departamento de Aviação Civil (DAC), é de 0,5 mm. Embora tenham chegado a outros resultados, peritos federais também concluíram que a macrotextura estava abaixo do recomendado. Foram realizadas duas medições. Na primeira, a média ficou em 0,48 mm. A marca seguinte foi de 0,58 mm. No documento, a PF sugere a interdição das operações até que o problema fosse resolvido. Depois do acidente, com a aplicação de ranhuras, a macrotextura subiu para 1,48 mm.
Para militares da Aeronáutica, a pista de Congonhas foi um dos fatores contribuintes para a tragédia do vôo 3054. O determinante continua sendo o fato de uma das manetes do jato ter permanecido em posição de aceleração. “É provável que os pilotos tenham confundido aquele comportamento estranho da aeronave com uma hidroplanagem”, avalia o coronel Ricardo Hein, chefe do 4º Serviço Regional de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Seripa 4). “O efeito psicológico contribui para a ‘visão de túnel’, quando se perde a capacidade de analisar outros fatores.”
O acidente da TAM não foi o único em que a suposta deficiência na pista de Congonhas foi citada. Na véspera da tragédia, um avião da Pantanal derrapou ao pousar. O relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa) aponta falhas do piloto e deixa claro que ele teria como corrigir o erro inicial, caso a pista estivesse dentro das especificações.
Os laudos da Direng e da PF divergem de outros relatórios sobre a pista. Os pareceres do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) - contratado pela empresa que reformou a pista em 2007 - e de técnicos da Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero) indicavam que a macrotextura tinha 0,6 mm. O perito Antonio Nogueira Neto, do Instituto de Criminalística de São Paulo, adiantou que contestará o laudo da Direng.
Em um aspecto, os cinco órgãos que inspecionaram o asfalto são categóricos: as duas pistas foram liberadas para operação sem a profundidade de 1 mm recomendada para pavimentos novos. A Infraero informou que só vai se pronunciar sobre o assunto após a conclusão do relatório do Cenipa. O IPT não retornou os pedidos feitos pela reportagem. A Aeronáutica também preferiu não comentar o laudo.