Acidente com voo Rio-Paris, em 2009, foi estopim da crise em torno dos procedimentos de segurança

Andy Pasztor e Daniel Michaels | The Wall Street Journal - Valor

A Air France-KLM, num esforço para ser mais transparente, deve divulgar resultados de investigação independente que critica amplamente algumas de suas práticas e regras internas de segurança.

As conclusões, que encerram estudo de um ano conduzido por uma comissão internacional de oito especialistas em aviação escolhidos a dedo por executivos do alto escalão da Air France, segundo pessoas a par da situação, devem ser anunciadas hoje.

O relatório é inusitado não só porque muitas vezes tem um tom crítico, mas porque a direção da companhia aérea pretende divulgar partes dele.

O estudo deve questionar, entre outras coisas, certos programas de treinamento de pilotos da empresa, ressaltando lapsos de disciplina na cabine de comando no decorrer de vários anos, ressaltando também a importância de treinar melhor as tripulações a lidar com falhas nos sistemas automatizados.

Em geral, segundo pessoas a par do processo, o relatório identificou várias deficiências na tradicional cultura de segurança da segunda maior companhia aérea da Europa.

O resultado, dizem as pessoas, é a recomendação de várias mudanças nos procedimentos e na supervisão interna, em parte para garantir que detalhes sobre incidentes e ameaças à segurança sejam analisados e comunicados rapidamente pela companhia.

A Air France já implementou muitas das recomendações, o que deve ajudar a suavizar as piores críticas. Mas especialistas em segurança aérea dizem que é raro qualquer grande empresa, especialmente uma companhia aérea mundial, dar a pessoas de fora tamanha liberdade para expor publicamente brechas nos sistemas de segurança.
 
A investigação foi iniciada no fim de 2009 pelo então presidente do conselho, Jean-Cyril Spinetta, seis meses depois da queda de um Airbus A330 da Air France que voava do Rio de Janeiro para Paris, que matou todos as 228 pessoas a bordo. Ainda não se sabe a causa do acidente - equipes de resgate ainda buscam a caixa preta do voo 447 -, mas ele aumentou imediatamente a atenção sobre o histórico de segurança e no treinamento de pilotos da Air France.

 
Durante o fim de semana, autoridades da empresa e integrantes da comissão - liderada por um ex-executivo de segurança da Boeing e especialista em fatores humanos, Curt Graeber - não quiseram comentar dados específicos antes da divulgação do relatório. Entre os outros integrantes está Nick Sabatini, ex-autoridade de segurança da agência do governo americano para o setor aéreo, a FAA; John Marshall, ex-chefe de segurança da Delta Air Lines; e David Woods, especialista em administração de risco e professor da Universidade de Ohio, dos EUA.

 
"Não consigo lembrar de outro exemplo de uma grande companhia aérea organizar um grupo tão prestigiado para realizar uma investigação abrangente", disse Bill Voss, presidente da Fundação de Segurança da Aviação.

 
Além de se concentrar em treinamentos e em questões técnicas e de segurança, segundo pessoas a par do relatório, partes dele devem comentar aspectos do relacionamento entre pilotos e administração que já causaram problemas à Air France. A comissão informou as conclusões ao presidente da empresa, Pierre Henri Gourgeon, na sexta-feira.

 
O relatório sugere que os treinamentos de pilotos sejam mais realistas, em parte com a reprodução de incidentes verdadeiros envolvendo pilotos da empresa, em sessões periódicas de simulação. Alguns gerentes de segurança da Air France já tinham concluído que o treinamento de simulação precisava ser atualizado e variado. Há anos que muitas aéreas importantes de outros países já incorporam rotineiramente cenários realistas a seus simuladores.

 
Refletindo as recentes prioridades de segurança da europeia Airbus, o estudo ainda recomenda passos para ajudar pilotos a usar instrumentos de reserva se os sistemas automatizados quebrarem ou apresentarem leituras suspeitas.

 
A comissão, conhecida como Missão de Especialistas Externos, deve apresentar hoje seu relatório para outra comissão da Air France que conta com representantes da diretoria e dos sindicatos, segundo porta-voz da companhia.

 
A Air France-KLM enfrentou quatro desastres significativos entre 1999 e 2009. Gourgeon já tinha dito que o histórico de segurança da empresa antes do acidente com o voo do Rio era melhor que a média do setor, e depois do acidente só se equiparou à media.

 
Depois do acidente, a Air France e seus pilotos entraram em conflito em questões como treinamento e procedimentos de segurança. Muitos especialistas em segurança aérea de fora da companhia sugeriram que um fator que contribuiu para o acidente foi a resposta inadequada dos pilotos a leituras errôneas dos sensores de velocidade.

 
No fim de 2009, a Air France enviou um memorando às tripulações, instruindo-as a seguir os procedimentos de segurança com mais atenção e a parar de criticar a empresa.
 

Colaborou David Pearson

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