Com a capacidade tomada em jatos executivos, empresa lança modelo gigante para a área militar
Roberto Godoy
Um comprador que apareça hoje na Embraer, levando na mão US$ 3 milhões em dinheiro vivo para pagar por um jato executivo Phenom 100, de seis lugares e 2,1 mil quilômetros de alcance, só vai ter a satisfação de garantir seu lugar na fila. Receberá a aeronave em junho de 2012.
A empresa está com a capacidade de produção tomada pelos próximos quatro anos no lucrativo segmento da aviação executiva. A situação não é mais folgada na linha dos produtos maiores, dos jatos regionais de 50 a 122 passageiros. As vendas contabilizadas em carteira chegam a US$ 15 bilhões, o suficiente para manter todos os hangares da empresa ativos, dia e noite, pelo menos até 2010 ou 2011.
No total serão entre 165 e 170 aeronaves até o fim do ano.
"A produção de 2008 também está vendida", garante o engenheiro Frederico Curado, presidente da Embraer desde abril. Para atender à demanda, foram contratados 4.500 funcionários.
Não é o limite. A empresa está apresentando um gigante militar ao mercado de defesa.
Destinado a transportar 84 combatentes de infantaria ou 64 pára-quedistas equipados, receberá, na configuração de carga, 20 toneladas. A fase de projeto e desenvolvimento vai exigir investimento de US$ 600 milhões. É caro, mas o engenheiro Curado acredita que "seja viável partilhar um terço disso junto a parceiros internacionais. Ainda assim, o Brasil será o País líder do programa".
Os estudos da Embraer indicam que é um bom negócio. Há cerca de 2.500 cargueiros dessa classe em operação no mundo. Entre 10% e 15% da frota está na etapa final de utilização e terá de ser substituída.
"O C-390 é útil, exportável e gerador de royalties. Interessa à Força Aérea Brasileira, que está bastante envolvida no projeto. Na verdade esse avião estará servindo à FAB no futuro próximo" sustenta Frederico.
O cargueiro birreator, tem um desenho avançado, de asa alta com grande porta traseira, e incorpora eletrônica digital de última geração. Voa a 850 km/hora. Cobre 6.300 km levando 12,5 mil quilos ou 2.400 km com 19 toneladas. Pode ser convertido em avião tanque e, por sua vez, também sairá da fábrica preparado para ser reabastecido em vôo. O vice-presidente para o Mercado de Defesa, Luiz Aguiar, quer lançar comercialmente o C-390 no primeiro semestre de 2008 "fixando as primeiras entregas para setembro de 2012".
O FUTURO É REGIONAL
O futuro da Embraer não passa pelas asas dos grandes jatos de longo curso. "No futuro, vejo a Embraer atuando nessa nossa faixa de aviões até 120 lugares, incorporando novas tecnologias que promovam ganhos de eficiência, aumentem a margem de lucro e a capacidade competição do operador", afirma Curado. Atuar fora desse conceito, "levaria a um enfrentamento direto com a Boeing e a Airbus - o que é, por definição, o mais poderoso fator de desencorajamento dessa atitude".
O setor do transporte regional é, todavia, promissor. A área técnica da empresa acompanha as pesquisas de novos motores. O objetivo é oferecer propulsores que permitam, sem perda de desempenho, de 15% a 20% de economia no consumo de combustível. Os novos materiais para a construção de fuselagens podem facilitar a concepção de cabines espaçosas sem prejuízo para a economia do transporte aéreo. "Estamos observando tendências e mantendo a política de assimilar os avanços com rapidez."
A concorrência, todavia, está crescendo. Curado reconhece a "principal presença" da canadense Bombardier, que apresentou no começo do ano o modelo C, considerado "muito desconfortável" pelos analistas da Embraer, para os quais "trata-se de um jato de 50 lugares expandido para 70 assentos e finalmente esticado para 100".
A preocupação ganhou novo componente há uma semana, com o lançamento do russo Sukhoi Superjet-100, jato regional de 100 passageiros. No show aéreo de Moscou, em agosto, o presidente Vladimir Putin visitou o estande do fabricante e disse que gostaria de ver o SSJ voando no mundo inteiro "como a concorrência (faz) hoje".
A aeronave vai custar 15% menos para atingir a meta de atender a 10% do mercado de US$ 60 bilhões previsto para os próximos 10 anos. "Os russos só estarão de fato na praça na próxima década", acredita Frederico, para quem "nada indica que até lá, ou mesmo mais além, a Embraer vá parar de vender".
As vendas militares da Embraer podem chegar a 20% do faturamento. Em 2006 ficaram em 5,9%. A base da ofensiva iniciada esse ano é o turboélice de ataque leve e treinamento, o Super Tucano (vendido para a aviação militar do Brasil e da Colômbia) e que pode ser habilitado para uma concorrência internacional do Pentágono. O primeiro lote é pequeno, não passa de seis aviões.
Jornais americanos revelaram que as aeronaves seriam repassadas para a empresa de segurança militar privada Blackwater, que as usaria na vigilância aérea das fronteiras do Iraque. A Embraer desconhece - e não comenta - a informação.