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Congonhas sofre por falta de planejamento

Samantha Maia, Daniela Chiaretti, Vanessa Adachi e Roberta Campassi

Valor Online

A falta de planejamento é a vilã do aeroporto de Congonhas. A reboque dela vieram o excesso de passageiros e a perigosa proximidade com áreas residenciais, dizem especialistas. Congonhas, que nasceu de um campo de pouso nos anos 30, numa época em que São Paulo tinha um milhão de habitantes, virou um "porta-aviões", na definição do arquiteto Jorge Wilheim, que exerceu vários cargos públicos, o último como secretário de Planejamento municipal na gestão Marta Suplicy. "Parece que trabalhamos sempre correndo atrás dos problemas e não estamos, de verdade, planejando", diz a arquiteta Regina Meyer, professora titular da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, a FAU-USP.

Paulo Sampaio, consultor de aviação, critica o fato de nunca ter sido levada a sério uma definição de uso de Congonhas. Na sua opinião, limitar os vôos aos que vêm e vão para as regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste, ajudaria a descongestionar o aeroporto, passando as conexões para outros Estados. "Há necessidade de disciplinar o uso, e quem ter que fazer isso é o governo." O número de desembarques em Congonhas em 2006 representa 18% do volume total registrado no Brasil, que foi de 102 milhões. O aeroporto paulista é o principal centro de conexão de passageiros do país. Estima-se que 30% dos vôos domésticos tenham Congonhas como ponto de conexão ou de partida e chegada.

Na sua visão, as conexões poderiam ser desviadas ao Galeão, no Rio, Confins, em Minas Gerais, ou para Brasília, o que retiraria de Congonhas um terço da quantidade de passageiros que transitam hoje. Essa mudança poderia se dar por meio de incentivos fiscais às empresas aéreas, segundo o professor da Universidade de Brasília (UNB), Adyr da Silva, que foi presidente da Infraero em 1998. "A aviação é um negócio", diz, "se os incentivos forem mais intensos, as empresas se adaptam".

Sobre a proximidade de Congonhas com casas, prédios e estabelecimentos comerciais, Silva sugere medidas drásticas: desapropriar, se a avaliação é que há riscos para os vôos. "O aeroporto existe desde 1936, quando aquela região era vazia. Faltou uma legislação que regulasse a apropriação da área." Ele entende que não há motivos para que Congonhas seja fechado.

O número de aeronaves em operação em Congonhas manteve-se praticamente o mesmo ao longo dos últimos anos (passou de 230.995, em 2002, para 266.231 em 2006, segundo a Infraero), mas o número de passageiros anuais cresceu de cerca de 12 milhões para 18 milhões, no período. A explicação é que as companhias passaram a utilizar aviões maiores. O ex-presidente da Infraero não enxerga nisso um fator de risco. "O tamanho do avião não influi, e sim sua capacidade de frear em distâncias curtas", diz.

Há outras visões sobre a mesa. Como políticas de médio e longo prazos para a estrutura aeroportuária de São Paulo, o presidente da TAM, Marco Antonio Bologna, aponta três saídas. A construção de um novo aeroporto em São Paulo, a melhoria da infra-estrutura para passageiros em Viracopos (Campinas) e a construção da terceira pista em Cumbica. Bologna não quis falar em possíveis locais para o novo aeroporto da capital paulista, mas indicou que o assunto está em discussão. "Há um debate sobre o novo aeroporto, que ainda não está definido. Quando o governo tiver uma decisão deverá ele mesmo comunicar", sustentou.

Quanto ao terceiro terminal de Guarulhos, Bologna afirmou que "já está atrasado". "Estava previsto no projeto do aeroporto que em 2007 já deveria existir a terceira pista e o terceiro terminal de passageiros. Estamos atrasados." O executivo da TAM acredita que a cidade não pode abrir mão de seu aeroporto central. "É difícil pensar que São Paulo possa viver sem Congonhas. É um aeroporto seguro, mas que tem suas restrições", disse. "Qualquer restrição adicional será fundamentada em fatores plausíveis e a TAM vai acatar."

Wilheim argumenta que é conveniente ter um aeroporto urbano - o que não é razoável é ter as casas tão próximas. "Mas já que ele existe, e é razoavelmente bem equipado, é preciso aliviá-lo", recomenda. A primeira urgência, segundo ele, é fazer o "atrasadíssimo" trem que ligaria o aeroporto de Guarulhos ao centro da cidade. "Os congestionamentos na marginal do Tietê tornam muito imprevisível encarar uma ida a Cumbica", registra. Com o trem, o percurso Barra Funda – Cumbica poderia ser feito em 22 minutos, cronometra. Dessa maneira, os jatos dos vôos executivos poderiam ser transferidos para Cumbica, desafogando Congonhas. Guarulhos, naturalmente, teria que ter o terceiro terminal e o quarto, como está no projeto original.

"Não há dúvida que Congonhas não pode mais ter um avião a cada 1,5 minuto", diz Regina Meyer. "Há 15 anos a gente vem dizendo que a pista não dá conta de aviões do porte que estão aí." Ela enxerga a região de São Paulo como uma macrometrópole, com três regiões metropolitanas comprimidas - a de São Paulo, a de Campinas e a de Santos. Defende, assim, um maior e mais descentralizado número de aeroportos. Isso teria que vir junto a uma malha de transporte público, que hoje não existe, e que faz com que seja fácil tomar metrô ou trem para sair do centro de Londres, Paris ou Amsterdã, e chegar rapidamente aos seus respectivos aeroportos, todos distantes dos centros urbanos.

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