O bilionário programa de investimentos anunciado pelo governo na aviação regional, que ainda pena para decolar, entrou na mira do Tribunal de Contas da União (TCU). A maior preocupação do órgão de controle é com os critérios usados para a escolha dos aeroportos que vão receber verbas federais para obras de reforma e modernização.
Uma avaliação do programa, que prevê R$ 7,3 bilhões de investimentos em 270 aeroportos regionais, foi concluída pelos técnicos e aguarda o voto da ministra Ana Arraes, relatora do processo, para ser apreciada no plenário da corte.
Para os auditores, não está claro por que tantos aeroportos foram contemplados, nem os critérios da Secretaria de Aviação Civil (SAC) para investir em algumas localidades antes das outras. Eles reconhecem a importância das intervenções anunciadas pelo governo, diante da necessidade de levar mais voos aos municípios do interior e da precariedade atual dos terminais, mas avaliam que o escopo e as prioridades do programa não foram devidamente justificados pela SAC.
O TCU acredita que há pouca lógica, por exemplo, na escolha de aeroportos com menos de 50 quilômetros de distância entre si para receber investimentos. Na visão dos técnicos, essa proximidade pode induzir ao uso inadequado do orçamento disponível, já que bastaria um único terminal modernizado para atender satisfatoriamente aos passageiros de uma mesma região. Essa situação de aeroportos "grudados" é encontrada em Francisco Beltrão e Pato Branco (PR), Lages e Correia Pinto (SC), Pelotas e Rio Grande (RS), Cacoal e Pimenta Bueno (RO).
O governo tem alegado que, nos locais onde há muita proximidade entre os terminais e o volume de passageiros é insuficiente, os estudos de viabilidade técnica e econômica vão indicar a melhor alternativa de investimentos entre as opções analisadas, mas não se pode excluir de antemão nenhum aeroporto.
Outra frente de questionamentos do tribunal é com a escolha dos primeiros terminais que vão receber obras. A SAC trabalha com uma lista de 28 aeroportos, dos quais 9 no interior de São Paulo, que já podem ter o lançamento de editais para a contratação de obras. Eles devem sair na frente, porque os projetos básicos de engenharia ficaram prontos antes dos demais.
O TCU, no entanto, vê falta de critérios na definição das prioridades e cobra esclarecimentos dos motivos que levaram algumas cidades para o topo da lista. Para os auditores, vários fatores poderiam ser apresentados, como declarações de interesse das companhias aéreas em iniciar voos regulares ou a definição de municípios "estratégicos" para o desenvolvimento turístico.
Sem clareza sobre isso, conforme a leitura do tribunal, abre-se espaço para especular se a influência política de prefeitos ou partidos pode ter pesado na ordem de execução dos investimentos.
Em um processo que corre paralelamente, o órgão de controle contesta ainda a necessidade de usar o regime diferenciado de contratações públicas (RDC) para as obras, como pretendem as autoridades. O governo deve optar pelo modelo de contratação integrada. As construtoras selecionadas vão se responsabilizar pelo projeto executivo de engenharia, pelas obras do terminal de passageiros, pista e pátio de aeronaves em cada aeroporto.
Na análise técnica do TCU, a urgência alegada para a adoção do regime simplificado não se sustenta, nem parece ser adequada a contratação de todos os serviços em um pacote só. Procurada, a SAC não quis se manifestar sobre o assunto e afirmou que aguarda uma deliberação do tribunal.
No âmbito do programa de aviação regional, a secretaria tem outro problema mais imediato para resolver, que envolve a tramitação da MP 652. A medida provisória, que introduz subsídios para voos a municípios do interior, recebeu uma mudança no Congresso Nacional. Na definição de aeroporto regional, apto a receber os subsídios, o relator Flexa Ribeiro (PSDB-PA) considerou que esse é o caso de terminais com movimentação de até 600 mil passageiros por ano.
Esse limite pode deixar de fora dos incentivos aeroportos que o governo tinha planos de fomentar com novos voos subsidiados, como São José do Rio Preto (SP), Ribeirão Preto (SP), Londrina (PR) e Maringá (PR). Nos aeroportos da Amazônia Legal, o relator fixou o limite de movimentação em 800 mil passageiros anuais.
Voos regionais - definidos como rotas entre municípios do interior ou desses municípios para capitais - vão receber subvenções estimadas em R$ 500 milhões por ano. O incentivo é limitado a 60 assentos por aeronave.
No programa de aviação regional, além dos subsídios e dos investimentos em aeroportos, o governo está criando a Infraero Serviços. A empresa, subsidiária da estatal Infraero, poderá ser contratada para gerir os terminais.