GRACILIANO ROCHA
DE PARIS - FOLHA DE SP

Peritos da Justiça francesa disseram a familiares dos passageiros do voo da Air France que caiu no Atlântico em 2009 e matou 228 pessoas que a degradação dos sistemas do avião Airbus A330 foi preponderante no desastre. O relatório é sigiloso e a reunião desta terça-feira foi feita a portas fechadas no Palácio da Justiça, em Paris.

Segundo relatos de participantes da audiência, a perícia afirmou que os erros cometidos pelos pilotos não são uma "resposta satisfatória" para explicar a queda da aeronave e disseram que algumas falhas apresentadas pelo avião foram "inaceitáveis".

A Air France e a Airbus foram indiciadas sob suspeita de homicídio doloso (não intencional) em 2011.

A linha seguida pela perícia judicial é diferente da adotada pelo BEA, agência do governo francês que investigou o acidente para emitir recomendações de segurança no tráfego aéreo.

Na semana passada, o BEA divulgou seu relatório final listando falhas humanas e técnicas, mas enfatizou manobras erradas dos pilotos.

Conforme os participantes da reunião, os peritos da Justiça apontaram pelo menos dez falhas nos sistemas e instrumentos usados pela Airbus no avião A330.

FALHAS EM SÉRIE

Os peritos judiciais concluíram que os problemas começaram com o congelamento das sondas que medem a velocidade do avião, foram agravados pela pane no computador de bordo, alimentado com dados contraditórios.

Em seguida, alarmes funcionaram mal e instrumentos como o diretor de voo deram ordens erradas aos pilotos.

Após a desconexão do piloto automático, o diretor de voo indicava que o avião deveria subir, quando, na verdade, os pilotos deveriam ter direcionado a aeronave para baixo para recuperar velocidade e evitar a queda.

Assim como o BEA, o relatório judicial também apontou falhas no treinamento da Air France e não eximiu os pilotos de seus erros -- como o fato de o comandante se ausentar da cabine sem distribuir claramente as funções entre os dois copilotos.

Conforme os relatos, também foi apontada omissão da Easa (Agência Europeia de Segurança Aérea) por não atualizar normas de segurança, mesmo com dezenas de registros de incidentes de perda de velocidade desde 2004.

"A menor responsabilidade foi da tripulação, que não estava treinada para aquela situação. Vários equipamentos falharam, transformando a cabine em uma discoteca diabólica", disse o advogado Carlos Villacorta, defensor de parentes de 41 vítimas.

Editoria de Arte/Folhapress

TRÂMITES

Diferentemente do Brasil, onde a investigação de possível crime é iniciada pela polícia, na França a tarefa cabe a um juiz de instrução.

Com a conclusão da perícia, a juíza Sylvia Zimmermann vai entregar em outubro um relatório da apuração às empresas, ao Ministério Público e aos representantes das famílias das vítimas.

As partes terão mais três meses para se manifestar e, depois, a juíza decidirá se encaminhará o caso para o tribunal ou se pedirá seu arquivamento.

Se o processo criminal for instaurado, a previsão de especialistas é que o caso seja julgado entre 2014 ou 2015. O julgamento é conduzido por outro magistrado, que não tenha participado do processo de investigação do acidente.

OUTRO LADO


A Air France disse que não se pronunciaria sobre a investigação judicial ainda em curso na Justiça francesa.

No comunicado divulgado após o relatório do BEA (agência do governo francês), na quinta-feira, a empresa afirmou que se antecipou às recomendações e promoveu mudanças no treinamento das tripulações.

A Airbus também foi procurada, mas não falou.

A Folha encaminhou ontem, por e-mail, questões sobre o mau funcionamento de equipamentos. A fabricante do A330 não respondeu.

Na semana passada, a Airbus disse que adotará medidas para "contribuir para o esforço coletivo em favor da otimização da segurança aérea".

A Folha não conseguiu contato com a Easa.

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