Scott McCartney, The Wall Street Journal
Algumas companhias aéreas tentam contratar comissários de bordo jovens e atraentes. A Jet-Blue Airways tem um tipo também: policiais e bombeiros. É "Law & Order: Tripulação de Cabine". Ou "CSI: jetBlue".
Desde que foi fundada há dez anos por David Neeleman - o americano-brasileiro que mais tarde criaria a Azul Linhas Aéreas Brasileiras -, a jetBlue, que tem sede em Nova York, já contratou várias centenas de policiais e bombeiros da cidade, em sua maioria aposentados, para seu quadro de comissários. Segundo alguns cálculos, 10% dos 2.400 funcionários de bordo da empresa têm experiência de resposta a emergências, embora a companhia não tenha o número exato.
O grupo de atendentes da primeira classe da jetBlue inclui um bombeiro aposentado, Leonard Spivey, que se tornou um exemplo para a companhia e ainda está voando, hoje aos 70 anos. Spivey trouxe seriedade para a função - crucial para uma companhia aérea sem experiência - e abriu o caminho para outros. Para a jetBlue, o foco dele em segurança era atraente, a sua maneira de assumir a responsabilidade e a calma sob pressão foram muito importantes e suas piadas infames e natureza bem humorada foram contagiosas.
A jetBlue decidiu desde o princípio que os novos funcionários não precisariam ter experiência com a aviação e que as contratações seriam locais. Quando Spivey apareceu, os recrutadores se deram conta de que pessoas que rotineiramente tinham lidado com emergências não entrariam em pânico a bordo de um avião. Policiais e bombeiros vinham de carreiras em que tiveram que lidar com o público e prestar serviços aos clientes, dizem representantes da jetBlue. Eles estão acostumados a trabalhar em feriados. Eles sabem como lidar com pessoas em situações estressantes e podem assumir o comando da cabine de um avião.
"Experiências passadas podem predizer comportamentos futuros", diz o diretor-presidente da empresa, David Barger. "Pessoas que não vão muito alto e não caem muito, é isso que você quer em áreas em que decisões precisam ser tomadas."
Vicky Stennes, vice-presidente de experiência em voo da jetBlue, diz que a cabine de um avião mudou consideravelmente depois dos atentados de 2001, com mais pressão sobre os atendentes de bordo. Antes de os sequestradores assumirem aviões e jogá-los sobre prédios, os comissários de bordo podiam chamar os comandantes para que eles, com sua autoridade, dessem fim a um problema. Agora, os comissários estão sozinhos porque os pilotos não podem deixar suas cadeiras.
O nível de estresse na profissão ficou em relevo semana passada, quando um comissário de bordo da mesma jetBlue, Steven Slater - que, diga-se, fez carreira no setor, e não na polícia ou nos bombeiros - surtou depois de um voo difícil, xingou os passageiros pelo sistema de som do avião, abriu a saída de emergência, pegou duas latas de cerveja e desceu pelo escorregador inflável no aeroporto JFK, em Nova York. Ele acabou preso, pagou fiança de US$ 2.500 e está respondendo processo.
"A polícia (NYPD) e o corpo de bombeiros (FDNY) de Nova York são quase marcas e eles se adaptam bem a nós", diz Stennes. "Isso se comprovou um sucesso tão rapidamente que nós fazemos um esforço para que a tripulação tenha membros com experiência em responder a emergências."
Para veteranos da polícia e do corpo de bombeiros de Nova York, que costumam se aposentar depois de 20 anos de serviço com metade do salário, uma segunda carreira como comissário de bordo oferece uma série de benefícios, entre eles passagens aéreas gratuitas ou com grandes descontos. Os ex-policiais e bombeiros que trabalham para a jetBlue dizem que o horário de um comissario de bordo se adapta bem ao que eles estão acostumados: alguns dias com muitas horas de trabalho, depois vários dias de folga. A remuneração é mais baixa, mas a flexibilidade é maior em alguns casos.
"Eu vim pra cá por causa do horário", diz Laura Romer, de 53 anos, uma ex-detetive e membro da equipe de negociação de reféns da polícia de Nova York que se casou, voltou a estudar e descobriu que trabalhar meio período para a jetBlue se adapta bem ao seu estilo de vida. "Eu gosto do fato de que saio do avião e o trabalho está concluído. Ninguém te chama à 1 ou 2 horas da manhã, dizendo 'nós pegamos o seu cara'", diz ela.
Os veteranos da polícia e dos bombeiros dizem que, como a maior parte dos comissários de bordo, procuram observar os passageiros quando eles estão embarcando, tentando identificar as pessoas que podem precisar de ajuda extra ou as que podem se tornar um problema. O melhor traço que trazem para a cabine do avião, dizem, pode ser a capacidade de pôr um fim a conflitos antes que eles se transformem em incidentes de ira no ar.
Como um policial, "você aprende a reduzir os problemas", diz Romer. "Não é o que você diz para as pessoas. É como fala com elas."
Charles Harris foi treinado, em parte, por Spivey, quando estava no corpo de bombeiros. Ele passou 25 anos no departamento até decidir se aposentar depois dos atentados de 11 de setembro de 2001. Harris estava no World Trade Center quando ele foi destruído; como muitos outros, perdeu amigos e colegas e participou de incontáveis funerais.
Agora na jetBlue, Harris, de 56 anos, diz que se vê mais como um "guardião da segurança" do que como um comissário de bordo. Ele conta que ensina aos comissários mais novos uma tática dos bombeiros: como alterar o tom e o volume da voz para atrair e manter a atenção de uma pessoa.
"Ao descer pessoas por uma escada, elas podem paralisar. Você tem que alternar seu tom de voz. Se você se mantiver gritando da mesma forma, elas paralisam", diz ele.
Spivey faz questão de apresentar as instruções pré-voo de pé na frente da cabine e olhando diretamente nos olhos dos passageiros. Ele fala de memória, em vez de ler em cartão, porque assim há mais chances de as pessoas prestarem atenção. Ele sempre termina com uma história popular, uma parábola sobre como as pessoas não devem se deixar levar pelas coisas pequenas, que faz com que as pessoas pensem no que é importante em suas vidas.
Se eles batem palmas, e a maioria bate, aí os passageiros são premiados com uma piada infame do seu enorme repertório.
A história serve a um propósito: quando os voos têm atrasos, Spivey relembra os passageiros sobre a lição da sua história e como não se importar com as inconveniências.
Depois de 30 anos como bombeiro em Nova York, Spivey tem a segurança como sua maior preocupação. Recentemente, em um voo de Nova York a San Diego, uma mãe tinha colocado o bebê em uma poltrona vazia e afivelado o cinto de segurança. Ele perguntou a idade da menina em um tom amigável e de avô e, depois, deu instruções rígidas sobre como colocar a menina de 21 meses no colo de um dos pais, com o cinto de segurança afivelado antes da decolagem.
"Parece uma ótima ideia", disse o pai da criança, Brian Summers, de Chappaqua, no Estado de Nova York, depois de ser informado sobre a experiência profissional de Spivey.
Spivey, que é o mais sênior dos comissários da jetBlue, conta que buscou trabalho na jetBlue porque gosta de viajar e se deu conta de que precisava de um emprego depois de várias visitas mal sucedidas aos hipódromos para apostar em corridas de cavalo durante a aposentadoria.