Servidores evitam assinar papéis temendo ser citados em investigações como as do TCU, o que contribui para atrasos
Sílvio Ribas, Vânia Cristino e Victor Martins - Estado de Minas
Brasília – A corrupção é hoje o fator principal para a paralisia da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), a estatal encarregada de administrar os aeroportos do país. Temendo serem envolvidos em alguma irregularidade, os funcionários concursados da companhia se recusam a assinar documentos referentes a licitações e a desembolsos de recursos. Com isso, obras para a ampliação e a recuperação dos terminais aéreos, muitos operando no limite da capacidade, estão atrasadas. "Aqui, o medo é de ter o nome citado em processos abertos pelo TCU (Tribunal de contas da União) ou pela Justiça e ser citado na imprensa. Como proteção, muitos recorrem o máximo possível à burocracia para emperrar o que for possível", disse um técnico da estatal. Segundo ele, várias pessoas podem se assustar com essa realidade. "Mas é uma forma legítima de proteção, dado o histórico dos últimos anos da empresa, envolvida em denúncias de desvios de recursos públicos e de superfaturamento", acrescentou.

O tamanho desse medo pode ser medido pelo desempenho da Infraero no ano passado, quando se esperava liberação recorde de recursos. Do R$ 1 bilhão que a estatal planejou investir, só R$ 645 milhões foram aplicados, conforme a organização não-governamental contas abertas. Só 1% dos valores disponíveis para contratos em aeroportos das 12 cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 foi gasto. “Trata-se de um quadro desalentador", ressaltou outro funcionário da empresa. Ele citou a decisão do Tribunal de contas da União (TCU) de suspender a concorrência para reforma do Aeroporto de Confins por identificar graves irregularidades. Também estão sob investigações as obras nos aeroportos de Brasília, Goiânia e Vitória.

Quem conhece o dia a dia da Infraero garante que, não bastasse a necessidade de se fazer "uma limpa" na empresa — de 600 cargos comissionados existentes até bem pouco tempo para acomodar indicações políticas só sobraram 12 —, dificilmente o governo Dilma Rousseff conseguirá dar andamento à proposta de abertura de capital da companhia. Aos olhos dos investidores, a Infraero de hoje não é atrativa, pois não tem patrimônio: os 67 terminais aeroportuários que administra são exclusivos da União. Além disso, a estatal não tem sequer um contrato de concessão, por meio do qual teria segurança jurídica de contar com o fluxo de caixa por tempo determinado.

ALTERNATIVAS Segundo analistas ouvidos pelo Estado de Minas, uma solução para reverter tal situação seria a Infraero incorporar como ativo toda a infraestrutura que gerencia — atualmente é dona apenas de sua sede, em Brasília. "Ainda que essa transferência ocorra, o processo será lento, atrasando mais as obras necessárias de ampliação e modernização dos aeroportos para a Copa do Mundo e as Olimpíadas de 2016", disse um integrante do governo. No seu entender, o melhor caminho para tentar reverter o caos que atormenta os viajantes será a transferência da concessão dos principais aeroportos à iniciativa privada. "Talvez, junto com a moralização da gestão da Infraero, essa seja a principal tarefa de seu futuro presidente, Gustavo Matos do Vale (hoje diretor do Banco Central)", ressaltou.

Para Sérgio Gaudenzi, ex-presidente da Infraero (2008), o governo deveria buscar para a estatal uma conformação de capital idêntica à da Petrobras, com predomínio societário da União, mas participação de acionistas privados e ações negociadas em bolsa. "Há condições legais para se criar essa estatal de economia mista e lamento que a discussão que inaugurei não tenha andado", disse. Ele ressalta que o modelo proposto traria mais transparência à gestão da Infraero, ao passar a ser fiscalizada por governo, acionistas e auditores do mercado financeiro. "É fundamental avançar na profissionalização da empresa e distanciar o risco de rateio político de cargos executivos, que quase sempre leva a pessoas que desconhecem o setor", sublinha.

Os entraves legais para a abertura de capital são confirmados por estudo da consultoria McKinsey encomendado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em 2010 e tornado público este ano. Seu raio-x da Infraero procurou oferecer ao governo opções para modernizar a gestão da empresa, além de abrir espaços para o investimento privado no setor. A consultoria sugere como alternativa a concessão isolada ou em blocos de aeroportos e a criação da Infraero SA, com potencial seguro de receita para os próximos anos. Apenas 15 da rede de aeroportos federais são considerados como lucrativos. Os demais requerem respaldo da União. O BNDES alerta que a abertura de capital pode levar até dois anos, se considerar as etapas necessárias para adequar a empresa às práticas de governança.

A Infraero avisa que questões relacionadas à mudança na sua gestão só podem ser respondidas pelo Ministério da Defesa, ao qual está submetida. A Defesa, por sua vez, informa que apenas o titular da pasta, ministro Nelson Jobim, está autorizado a fazer comentários sobre o tema.

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