Para definir os preços das passagens, empresas aéreas usam fórmulas complexas e a lógica de uma Bolsa de Valores


Melina Costa - O Estado de S.Paulo

Para um consumidor, poucos universos são tão enigmáticos como o dos sites de companhias aéreas. Como é possível que o mesmo produto - o mesmo voo, ligando o mesmo par de cidades - apresente uma profusão de preços distintos dependendo de mínimas diferenças de horário? E o que faz o valor das tarifas mudar em questão de horas?

A supersegmentação de preços é um reflexo do momento vivido pelas empresas aéreas. "As companhias tornaram-se mais eficientes e já não têm muito onde cortar custos. Nesse cenário, tornou-se mais importante maximizar a receita", diz Vanessa Ferraz, analista do HSBC.

A grande arma das companhias para encher seus aviões cobrando o máximo possível de cada passageiro é o chamado revenue management (gerenciamento de receita). "Testamos a elasticidade para saber o quanto os consumidores estão dispostos a pagar", diz Maurício Oliveira, diretor estratégico de receita da TAM.

Obviamente, a "elasticidade" pode ser maior ou menor dependendo do passageiro. A dificuldade está exatamente em atrair todos os perfis, sem cobrar pouco de quem poderia desembolsar mais e sem deixar de fora os que, mesmo pagando menos, ajudam na rentabilidade.

"A maioria dos custos de um voo é fixa, independentemente do número de passageiros transportados. Portanto, é melhor para a rentabilidade que entrem R$ 20 do que deixar um assento vazio", diz Trey Urbahn, vice-presidente Comercial e de Planejamento da Azul.

Na TAM, a definição dos preços é feita com a ajuda de 20 sistemas de computador. Alguns de seus aviões decolam com até 50 tarifas diferentes incluindo, entre outras variáveis, a antecedência de compra e os vários canais de vendas, de agências de viagens à internet.

Inteligência. Os softwares usam sistemas de modelagem estatística que analisam um histórico de 331 dias para a procura daquele voo e dão sugestões de preços. Ao mesmo tempo, os 80 analistas da TAM fazem, manualmente, cerca de 800 mudanças de preços por dia dependendo da movimentação de concorrentes e mudanças na demanda. Na ponte aérea Rio-São Paulo, o preço das tarifas é acompanhado de meia em meia hora. A flutuação, determinada pela oferta e demanda, lembra o ambiente de uma bolsa de valores. "É um exercício de ameaça, oportunidade, força e fraqueza", diz Oliveira.

Recentemente a TAM criou uma área de pesquisa para estudar fórmulas matemáticas que possam aprimorar os modelos estatísticos. Trata-se de um campo de pesquisa global, que envolve tanto as companhias aéreas como pesquisadores de instituições como o aclamado MIT (Massachusetts Institute of Technology), nos Estados Unidos.

O revenue management tem algumas regras gerais. A primeira diz respeito aos horários de pico. As passagens mais caras se concentram entre às 7h e 9h e entre às 17h e 19h. Tratam-se dos períodos de preferência dos passageiros de negócios, que têm mais urgência para viajar e se dispõem a pagar mais caro.

A segunda regra diz respeito à antecedência da compra. A Azul, por exemplo, tem seis níveis básicos de preço assim divididos de acordo com o número de dias de antecedência: 30, 21, 14, 7, 4 e no dia na viagem. Entre os extremos dessa lista, o valor da tarifa pode multiplicar por quatro.

Para a Azul, o revenue management também é uma ferramenta de marketing. Em vez de investir em propaganda, a companhia procura atrair o máximo de novos consumidores possível e gerar o boca a boca.

"TAM e Gol não vão nos deixar ter grandes vantagens de preço. Então, procuramos ter nos nossos aviões mais gente pagando tarifas baixas na comparação com os concorrentes", diz Urbahn. "Focamos mais na ocupação das aeronaves que no preço." No primeiro semestre, os aviões da Azul decolaram com 86% de seus assentos ocupados, em média. A taxa das concorrentes Gol e TAM não passou de 66%.

Em busca da fórmula para encher aviões e cobrar o máximo possível


Peter Belobaba, pesquisador do MIT e criador de uma teoria para calcular a otimização do uso de
assentos das aeronaves

Quando o gerenciamento de receitas das companhias aéreas começou a se sofisticar?

Foi há uns dez anos, com o surgimento das companhias de baixo custo e baixa tarifa, que começaram a oferecer novas estruturas de preço. Antes a regra era: passagens mais caras para homens de negócios e mais baratas para viajantes a lazer. As low cost começaram a oferecer mais barato para todo mundo.

Quão importante é a precificação para as companhias?

O drama das empresas é: como teremos mais receita? Se conseguimos demanda com tarifas de U$100, fechamos o avião por esse preço ou será que conseguiríamos vender por U$150? Esse tipo de decisão é crucial, já que a maioria das companhias aéreas passou a maior parte da década perdendo dinheiro. São poucas as indústrias que consideram boa uma margem de 3%.

E qual a maior dificuldade desse processo?

É estimar quanto os consumidores estão dispostos a pagar, calcular a probabilidade de conseguir esses consumidores por U$150. A maioria das previsões funciona melhor em ambientes estáveis - e esse nunca é o caso das companhias aéreas. Os sistemas também não levam em consideração fatores externos, como a escolha da cidade da Copa do Mundo, por exemplo. Hoje, os modelos de cálculo consideram o histórico de reservas. Os novos estudos levam em conta as informações de competidores. Afinal, é difícil vender a U$150 quando o concorrente vende a U$100.

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