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Adotados pelo Tom Jobim

Família argentina que mora o Panamá se perde na volta para casa e vive há duas semanas da solidariedade no aeroporto internacional

Carlos Braga e Vasconcelo Quadros – Jornal do Brasil

O endereço da família Sava, na maior parte dos 34 últimos dias, tem sido o Aeroporto Internacional Tom Jobim. Lá eles dormem, banham-se, almoçam, jantam e tomam café da manhã. À noite, Liliana Edith Sava, 43 anos, lava a roupa das filhas Elizabeth Guadalupe Sava, 6 anos, Bianca Carolina Sava, 4 e Johana Elena Sava, 2, na pia dos banheiros, e as pendura debaixo das mesas da praça de alimentação. As maiores, ela estica sobre os carrinhos usados para carregar malas. Tudo é feito com muita discrição, para não interferir no dia a dia do lugar.

– De manhã já estão secas – garante Liliana.

Elas, Carlos Ignacio Chavez, 49 anos, o pai das crianças, e Edith Noemi Villanueva, 49 anos, irmã dele, esperam uma solução, que não fazem ideia de onde poderá vir, para voltar para casa, no Panamá.

Chegaram ao Rio no dia 11 de junho, dia de Corpus Christi, vindos de uma atribuladíssima viagem de ônibus de Buenos Aires. Quatro dias após a decolagem do voo. Não adiantaria nada se tivessem sido pontuais. No Galeão, descobriram que a passagem reservada por uma amiga não havia sido paga. E o dinheiro que tinham havia sido gasto no trajeto até o Rio.

– Chegamos por volta de 11h. Tivemos que esperar até as 2h para o guichê da companhia aérea abrir – lembra Carlos.

Ligaram para todos que conheciam para pedir ajuda em dinheiro. Enquanto o auxílio não vinha, um amigo panamenho pagou, com cartão de crédito, quatro dias de hospedagem e alimentação em um hotel da Praça Tiradentes, no Centro. Foi providencial. Neste período puderam tratar da gripe da caçula. Terminada a estada por falta de dinheiro, ligaram para o consulado da Argentina. Foram informados de que só poderiam receber passagens de ônibus para retornar a Buenos Aires.

– Não temos casa nem emprego em Buenos Aires. O consulado nos deu R$ 50 e um saco com pacotes de fraldas – contou Carlos.

Com o dinheiro, a família foi a um supermercado da Ilha do Governador comprar leite, pão e queijo.

Liliana achou tudo muito caro no Galeão. Na mesma quadra do supermercado, havia uma igreja evangélica.

Resolveram bater à porta e pedir ajuda. Os fiéis condoeram-se da situação dos Savas. Principalmente Buchecha (que compunha com o morto Claudinho uma dupla de funk melody), que lhes comprou sacolas e mais sacolas de alimentos e ainda pagou quatro dias de hospedagem em um hotel da Praia da Bica, na Ilha.

– Ficamos esperando para ver se nossos amigos conseguiam reunir dinheiro para nossa volta. Mas não deu e tivemos que voltar para o Galeão – lamentou Liliana. – Procuramos ser discretos pra não incomodar ninguém. Não queremos ser expulsos para rua. Aqui pelo menos é seguro.

Mas a situação dos Savas era tão difícil, que permitiram que usassem as dependências do aeroporto enquanto não a resolviam. Usavam o berçário para dar banho nas crianças com uma ducha de mão. Quando terminavam, os adultos se viravam como podiam para se lavar. Em uma das vezes que entrou no banheiro para lavar o rosto, Carlos teve o celular, que deixara em cima do cesto de lixo, roubado.

– Fomos a um departamento de assistência social da prefeitura, no Centro. Encontramos Jaime e Cida, duas pessoas de coração muito grande – relatou Liliana. – Eles fizeram contato com consulados e conseguiram um abrigo para nós na Praça da Bandeira. Mas achamos perigoso ficar lá com as crianças.

Voltaram, então, para as mesas da praça de alimentação, vizinhas a um salão de beleza, cujas funcionárias se encantaram pelas três despachadíssimas crianças. Contaram a história para uma cliente do salão, que trabalha no aeroporto. Ela decidiu que levaria todos para casa.

Ontem a família Sava ainda não sabia onde iria passar a noite. Tinham uma promessa de abrigo na casa de alguém, na Ilha do Governador. Agora esperam por uma resposta para ver se podem viajar em um avião da FAB para Boa Vista. De lá, um amigo os levaria de carro à Venezuela. Depois? Não sabem.

– Não conhecemos o Corcovado, o Pão de Açúcar nem as praias – conta Liliana. – Mas deu para conhecer o coração do carioca. E ele é muito bom.

Jornada começou com doença de avô, em Buenos Aires

Se não fosse a solidariedade, talvez a família Sava nem tivesse chegado ao Rio. Desembarcaram em Buenos Aires, em outubro de 2008, para visitar o pai de Carlos, que estava doente. Ficariam 15 dias, mas para ajudar os pais, idosos e sozinhos, ficaram até 14 de maio. Não tinham mais dinheiro. Conseguiram algum emprestado para vir para o Rio, onde a passagem aérea é mais barata. Viajaram, na parte argentina, até Concórdia, de lá para Passo de los Libres, que faz fronteira com Uruguaiana (RS). Um problema com visto das meninas lhes custou uma multa que esgotou o dinheiro que tinham.

– Ficamos três semanas em Passo de los Libres esperando ajuda dos amigos.

Obtido, foram de Uruguaiana para Porto Alegre. Desceram o país em busca de passagens mais baratas para o Rio. Da capital do Rio Grande do Sul, rumaram para Coritiba e, de lá, para o Rio. Sempre buscando as tarifas mais baixas.

– Viajávamos à noite para não termos que pagar hotel para dormir. Quando chegamos na rodoviária do Rio, achamos tudo muito caro. Achamos uma senhora que vendia sanduíche e cafezinho do lado de fora – lembra Carlos.

Os Savas também encontram boa vontade entre os funcionários do Galeão. Um dos restaurantes, dá os leites que as crianças bebem. Quando soube da história, o dono de outro restaurante, passou a fornecer café da manhã e almoço para todos. Como não tinham mais dinheiro, empregados de uma lanchonete fizeram uma vaquinha para conseguir o valor necessário para que eles retirassem uma mala retida no guarda-volumes.

– As meninas do salão de beleza sempre nos dão cafezinho quando fica pronto – comove-se Liliana.

– Uma delas deu R$ 10 para a Bianca no dia do aniversário dela, segunda-feira.

Não foi o único presente que Bianca recebeu. A família de Walber fez uma festa com bolo, cachorroquente, docinhos e um monte de presentes para a menina, que fez cinco anos.

– Nossa! Encheram-na de presentes – conta Carlos. – Ficamos todos muito felizes.

Antes da comemoração de Bianca, a família de Walber fez um churrasco com violão e cantoria para descontrair os novos amigos. Carlos, que segundo Walber é um exelente violonista, soltou a voz.

– Tinha churrasco, frango, linguiça, vinho, cerveja e costela, muita costela – lembra, Carlos, salivando.

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