Colisões de pássaros com aviões aumentam 31% entre 2007 e 2008 e se tornam uma das maiores ameaças à segurança dos voos no país. Este ano, até abril, já foram registrados 252 incidentes desse tipo



Ullisses Campbell

São Paulo — “Cuidado com os pássaros!” A placa com o alerta está fixada na cabeceira da pista do Aeroporto de Santarém (PA) para lembrar os pilotos de uma ameaça constante em vários terminais brasileiros. Aves de diferentes espécies rondam as pistas de pouso e decolagem, colocando em risco a segurança dos voos. No segundo maior terminal do Pará, a presença é dos urubus e dos quero-queros, que também marcam presença em sete aeroportos internacionais do país. Por isso, se tornaram uma das maiores preocupações do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), ligado ao Ministério da Aeronáutica.

Há motivos para tanto. O espetacular pouso do avião da US Airways no Rio Hudson, em Nova York, em janeiro passado, por exemplo, foi forçado por pássaros sugados pela turbina. Já no Brasil, na quinta-feira da semana passada, os 80 passageiros do vôo 6742, da WebJet, que seguia de São Paulo para Salvador, levaram um susto quando a aeronave estava pousando na capital baiana. Um urubu atingiu a asa esquerda do avião. “O barulho foi assustador. Parecia uma explosão”, conta a publicitária paulista Gabriela Magalhães. Depois do incidente, o Boeing 737 teve que seguir para a manutenção.

Engana-se quem pensa que uma ave do tamanho de um urubu é inofensiva nesses casos. Dependendo da velocidade em que estiver a aeronave, o impacto do animal, que pesa cerca de 2kg, pode chegar ao equivalente a 7t. O mesmo de um carro que bate a 60km/h. “A ave que atingiu o avião em salvador fez um buraco na asa”, conta o mecânico aeronáutico Carlos Cardoso, do Sindicato Nacional dos Aeroviários.

Entre 2007 e 2008, a colisão de aviões com pássaros aumentou 31% em todo o país. O major Henrique Rubens de Oliveira faz um alerta: “Estimamos que 75% dos casos de colisões de aviões com pássaros sejam subnotificados”.

Não são só as aves de médio e grande porte que ameaçam a aviação no país. Animal símbolo da paz, o pombo também é motivo de preocupação. No início de abril, um desses pássaros foi sugado pela turbina de um Boeing 737 da Gol que fazia um voo de Teresina a Brasília. A turbina pegou fogo, causando pânico entre os passageiros. O avião teve de voltar ao Aeroporto Petrônio Portella, onde fez um pouso forçado depois de sobrevoar a capital do Piauí por 50 minutos, para queimar o combustível e diminuir as chances de explosão durante o procedimento. “O barulho era ensurdecedor. Parecia que o avião era velho. O impacto também foi grande durante o pouso”, relata o deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), um dos passageiros. Já no Aeroporto Santos Dumont, no Rio, a ameaça vem das gaivotas.

“É uma loteria. Tem vezes que eu vou pousar e não há uma ave sequer. Em outras, quando o dia tem sol e vento, há centenas delas”, conta o piloto Carlos Tolentino, que opera aviões particulares.

Variedade

Cerca de 30 espécies de aves já foram identificadas perto dos aeroportos pela Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), pelo Cenipa e pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Entre as mais comuns, estão dois tipos de patos e uma espécie de coruja comum no cerrado. “As aves noturnas procuram as pistas em busca de calor, que fica retido”, explica o biólogo Matheus Carneiro, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Desde o ano passado, a Infraero mantém em seu quadro 12 biólogos que desenvolvem projetos para conter o número de acidentes envolvendo aves. Em algumas pistas, como a do Aeroporto Carlos Drummond de Andrade (Pampulha), em Belo Horizonte, eles testam falcões para espantar as outras espécies. Segundo a Infraero, a maior causa da proliferação de aves perto dos terminais é o crescimento desordenado das cidades e a manutenção de lixões, curtumes e invasões perto das pistas.

Projeto no Congresso

A Infraero e o Cenipa trabalham pela aprovação de um projeto no Congresso que busca prevenir a colisão de aviões com aves nos aeroportos brasileiros. Apresentada pelo deputado Wanderley Alves de Oliveira, o Deley (PSC-RJ), a proposta foi elaborada por técnicos do governo federal. Segundo o superintendente de Segurança Aeroportuária da Infraero, Abibe Ferreira, o PL 4464/04 consolida diversas normas sobre segurança aérea e estabelece penalidades para quem descumpri-las. Já aprovado pela Câmara, o texto aguarda votação no Senado. “Uma lei específica dará mais rigor ao cumprimento das normas”, sustenta Ferreira.

Hoje, as medidas de prevenção são reguladas por alguns normativos, entre eles a Resolução 4/95 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). A norma estabelece que as áreas de segurança aeroportuária (Asa) vão até um raio de 20km dos aeroportos que operam de acordo com as regras de voo por instrumento e de 13km para os que operam sem instrumentos, como os aeroportos do interior. Nessas áreas, não são permitidas atividades consideradas “foco de atração” de pássaros, como matadouros, cortumes, culturas agrícolas e vazadouros de lixo. Mas a regra nem sempre é respeitada.

“O projeto é oportuno, mas é preciso conscientizar a população com campanhas. Muita gente ainda não acredita que um pássaro seja capaz de derrubar um avião”, defende o mecânico aeronáutico Otaviano Steglich.

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