Setor de inteligência ajudou a despolitizar a estatal e aumentou a presença militar na aviação
Vasconcelo Quadros
BRASÍLIA - JB
Há algo a mais no ar além de aviões de carreira e dos cargos tomados do PMDB na Empresa
Brasileira de Infra-estruturar Aeroportuária (Infraero). O plano do presidente da estatal, brigadeiro Cleonilson
Nicácio Silva, moraliza e profissionaliza o órgão, mas amplia a militarização do setor e consolida uma ousada
máquina de espionagem que vem sendo azeitada nos últimos três anos e se destacou com mudanças
radicais que, em abril, pegaram de surpresa os políticos da base aliada do presidente Lula e seus
apadrinhados.
A nova ordem dentro da Infraero vem sendo dada por um órgão de nome pomposo, a
Superintendência de Inteligência Empresarial, ocupada por oficiais e profissionais de inteligência, cuja
atuação norteou a reforma administrativa que resultou na redução dos contratos especiais preenchidos por
indicação política. No início de abril deste ano, a limpeza promovida pelo brigadeiro Nicácio Silva resultou na
eliminação de 97 postos entregues a políticos num nicho conhecido por contratos especiais – caiu de 109
para 12 – e na substituição de mais de 90% dos demais cargos de confiança na chefia das 96
superintendências espalhadas pelo país – 25 delas na sede da empresa em Brasília, quatro regionais (São
Paulo, Rio de Janeiro, Manaus e Recife) e 67 em aeroportos administrados pela Infraero nos Estados.
Aplaudidas pelos funcionários e bombardeado pelos políticos do governo, as mudanças foram
pautadas pelo pente-fino dos agentes de inteligência – funções que maldosamente se habituou a tratar por
arapongas –, que ganharam relevo na gestão do brigadeiro. Ele transformou em superintendência ligada
diretamente a seu gabinete uma estrutura pelos antecessores como órgão de assessoramento.
O grupo é formado por oito profissionais, cinco deles dos quadros da Infraero e outros três
contratados – originário da Força Aérea Brasileira (FAB) –, chefiados pelo coronel Hélcio Medeiros Ribeiro,
oficial com experiência nas áreas de espionagem e contra espionagem e conhecido membro da
"comunidade", há dez anos lotado na Superintendência de Segurança Aeroportuária. No início deste ano, a
Infraero juntou-se aos mais de 30 estatais federais que integram o Sistema Brasileiro de Inteligência (Sisbin),
cujo órgão central vem a ser a Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
Susto
É um salto necessário à atividade de inteligência numa área suscetível a ocorrências que vão do
tráfico de drogas e corrupção ao terrorismo, mas um susto numa classe política que ainda vive a paranóia do
período militar, onde a espionagem política era uma prática tão rotineira quanto o movimento nos saguões
dos aeroportos. A presidente do Sindicato Nacional dos Aeronautas, Graziella Baggio, afirma que o reforço
da estrutura de inteligência ilustra o fracasso do plano de desmilitarização da aviação civil, iniciado com a
criação do Ministério da Defesa, em 1999.
– Os militares controlam o tráfego, a inteligência e todos os órgãos ligados à prevenção,
administração e regulação do setor – diz Graziella. Ela acha que a militarização do setor, reforçada depois do
apagão aéreo de 2007, é uma contradição do governo petista e um retrocesso no processo de
desmilitarização do setor aéreo, para o qual o ministro Nelson Jobim, da Defesa, fechou os olhos para não se
indispor com a tropa. Graziella acha que a presença do Nicácio Silva quebra o ritmo civil na administração da
empresa, mas reconhece que a atuação do brigadeiro encontra ressonância entre os funcionários que, como
ele, são nacionalistas (contra a privatização) e torcem o nariz para as ingerências políticas que resultaram em
denúncias de corrupção e no cabide de empregos agora detonado.
–Ele aproveitou a onda pela ética e moralização. O poder militar na aviação civil aumentou porque
representa uma carreira, reserva de mercado e controle ideológico – diz a presidente do Sindicato dos
Aeronautas. Segundo ela, todos na aviação sabem que a Inteligência Empresarial espiona e foi o
responsável pela produção de dossiês que, se de um lado escancarou supostos esquemas de corrupção, de
outro afastou dos cargos de direção da empresa as indicações políticas. – O Carlos Wilson foi vítima e se
queixava de não poder combater o grande poder militar dentro da Infraero.
Favorável à faxina que vem sendo feita na Infraero, o presidente do Sindicato Nacional dos
Aeroportuários, Francisco Lemos, diz que tem notícias do reforço da inteligência desde o motim dos
controladores de vôo, em 2007. – A gente ouve comentários (apontando) que a Inteligência Empresarial é o
pessoal da escuta – diz Lemos.
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