Zínia Baeta, de São Paulo
A disputa judicial entre ex-trabalhadores da Vasp e o empresário Wagner Canhedo, dono da companhia aérea, ganhou um novo episódio que, desta vez, pode ser encerrado no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Há menos de um mês, a Justiça de Brasília aceitou o pedido de recuperação judicial da Agropecuária Vale do Araguaia, pertencente ao empresário. Com a medida, abre-se o prazo para a apresentação de um plano de recuperação e ficam suspensas as cobranças existentes contra a empresa pelo prazo de seis meses, como prevê a lei.
A questão seria corriqueira, não fosse o longo embate que envolve a Araguaia - proprietária da fazenda Piratininga, um complexo agropecuário de 135 mil hectares em Goiás - e os trabalhadores da Vasp, que já ganharam na primeira instância da Justiça do trabalho o direito à posse da fazenda. Com o pedido de recuperação, o plano de venda da Fazenda, avaliada em R$ 421 milhões, pelos trabalhadores para sanar seus créditos deixa de estar tão perto, pois a questão provavelmente exigirá novas discussões na Justiça comum.
Os débitos trabalhistas da Vasp e as demais empresas do grupo Canhedo - que englobam pelo menos três empreendimentos - passaram a estar interligados em 2005, quando o empresário assinou um acordo perante a Justiça pelo qual comprometia seu grupo econômico a assumir os débitos dos funcionários da Vasp, caso a aérea não os quitasse. Como isso não ocorreu, as empresas do grupo passaram a ser responsabilizadas solidariamente pela Justiça do trabalho por essas dívidas. Neste ano, em uma ação civil pública, que dentre outras têm o Sindicato Estadual dos Aeroviários como parte, a Justiça penhorou a fazenda em favor dos trabalhadores e a primeira instância concedeu a eles sua posse - instrumento denominado adjudicação no meio jurídico. Wagner Canhedo recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo e agora aguarda uma decisão. Se a decisão for confirmada e a recuperação judicial não interferir - como esperam advogados dos trabalhadores - no procedimento, essa seria a primeira vez na história em que um grupo de credores teria a possibilidade de receber parte de seus créditos sem participar do processo de falência de uma empresa. A Vasp teve a falência decretada pela Justiça de São Paulo no início de setembro.
O advogado Carlos Duque Estrada Jr. - que representa 550 trabalhadores da Vasp em 870 ações individuais e, nesse caso específico, o Sindicato dos Aeroviário no Estado de São Paulo, juntamente com o advogado Francisco Gonçalves Martins - está otimista. Na interpretação do advogado, o juiz que deferiu o pedido de recuperação judicial não teria incluído a execução relativa à fazenda Piratininga nos casos de suspensão de cobrança. Segundo Duque Estrada, o magistrado incluiu, em sua decisão, a situação prevista no artigo 49 da Lei de Falências e Recuperação de Empresas. O dispositivo prevê que credores titulares de posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, dentre outras situações, não se submeterão aos efeitos da recuperação judicial. O advogado afirma que essa seria a situação dos trabalhadores da Vasp em relação à adjudicação da fazenda. Para ele, ainda que esse não fosse o caso, se a empresa não pagar os ex-empregados da Vasp no prazo de um ano da aprovação do plano, a execução da fazenda voltaria a correr.
De qualquer forma, Duque Estrada afirma que entrará com um recurso - um conflito de competência - no STJ. Segundo ele, o sindicato pedirá que a corte reconfirme o que já decidiu no ano passado em relação à solidariedade do grupo econômico. O STJ julgou que a execução da ação civil pública poderia continuar, em relação às empresas do grupo Canhedo, ainda que existisse a recuperação judicial da Vasp.
O advogado da Agropecuária Vale Araguaia no processo de recuperação judicial, Éverson Ricardo Arraes Mendes, afirma que a ação de recuperação é anterior à adjudicação, a qual ainda aguarda-se o julgamento de um recurso. Além disso, ele afirma que o sindicato dos aeronautas não poderia ser parte na ação civil pública - argumentos que, dentre outros, ele apresenta para questionar a intenção dos trabalhadores em suspender a recuperação judicial. Ele afirma que a fazenda tem 38 anos, gera 300 empregos diretos e é necessária para a economia da região.