Júlio Ottoboni

São José dos Campos (SP), 3 de Setembro de 2008 - A Embraer estuda a retomada da produção de um avião turboélice derivado da plataforma de seu jato ERJ-145 para enfrentar a crise do petróleo. Os impactos negativos da alta dos preços do querosene aeronáutico sobre o setor deverá manter-se, segundo estudos, até 2015 com possibilidades de se estender a 2018.

Também há forte apelo por parte dos usuários e operadores para que novas tecnologias menos poluentes sejam empregadas na motorização das aeronaves comerciais. O novo turboélice da Embraer terá entre 50 e 60 lugares, usará motor Rolls Royce de última geração, ainda em desenvolvimento, que economizará 22% de combustível e estará apto a funcionar com diversos tipos de combustíveis, principalmente os de baixa emissão de dióxido de carbono.

Apesar de no último mês o presidente da Embraer, Frederico Fleury Curado, negar que haja estudos específicos para retomar a produção deste tipo de aparelho, ele reafirmou a intenção de avançar no tema. Desde o começo deste ano, nos primeiros sinais de aumento no preço dos barris de petróleo, a Embraer já se pronunciava a favor da volta dos turboélices.

"Não considerávamos aviões turboélice, não achávamos que tinham possibilidades de mercado. Com o aumento dos preços dos combustíveis, voltou a integrar a pauta de opções. Isto é parte do acompanhamento permanente de oportunidades de mercado", declarou Curado na época.

Porém, não é só a crise do combustível e as pressões por tecnologias limpas que impeliram a Embraer a resgatar uma tecnologia de propulsão deixada de lado ainda nos anos 80, com o avião Brasília EMB-120.

Estudos como o da companhia de consultoria em aeronáutica, Teal Group Corporation, dos Estados Unidos, mostram indicativos expressivos de crescimento nas encomendas de turboélices. No ano passado foram efetuadas 210 vendas, quase 120% sobre os 97 contratos firmados pelas fabricantes em 2006.

O relatório da Teal afirma que existe um "notável aumento de 30% a 45% nos negócios nesse campo nos últimos 20 meses". A própria Embraer reconhece a tendência crescente deste segmento, que tem um mercado estimado de mil aparelhos para os próximos 10 anos.

Sem preconceito

Outro fator de estímulo no investimento de uma nova geração de aviões turboélices pela Embraer seria a superação do preconceito pelo usuário quanto a esse tipo de aparelho, considerado inseguro, barulhento e sem conforto. Os passageiros habituais de vôos por volta dos 1,5 mil quilômetros estão propensos a gastar mais tempo na duração do trajeto se isto refletir em preços menores das passagens. Dois aspectos seriam fundamentais para esse consumidor: pontualidade e baixo custo.

Como o jato consome bem mais que a propulsão a hélice, a grande vantagem para os turboélices seria a economia conseguida em vôos de curta distância. Já que o uso do jato é mais adequado em longas, nas quais velocidade e altitude são cruciais.

No item conforto e segurança, os novos motores da Rolls Royce, estão sendo projetados para ingressarem no mercado dentro de dois anos e revolucionarem o setor. A promessa da fabricante britânica é alcançar até 50% em economia de combustível, levando em consideração tanto novos combustíveis como o aperfeiçoamento aerodinâmico das aeronaves - em aerodinâmica poderia haver redução de 3% nos custos.

A propulsão teria como aliada principal um projeto da Embraer tido, nos anos 80, como um imenso fracasso, o CBA-123. Feito em parceria com a Argentina, o avião turboélice nunca decolou comercialmente. Mas os arranjos técnicos desenvolvidos pela engenharia brasileira praticamente solucionou as sensações de insegurança e desconforto causados pelos motores sobre as asas.

No caso do CBA-123, os motores foram postos na parte de trás do aparelho, próximo a cauda. Inclusive as hélices são situadas na mesma posição, pois giram no sentido contrário ao motor convencional e passam despercebidas pelos passageiros.

Produção chinesa

Outro agente facilitador é o fato da Rolls-Royce ser a parceira-fornecedora de motores para a família de jatos 145 da Embraer e do modelo executivo Legacy. Atualmente, esses modelos são produzidos pelo consórcio Harbin-Embraer , que mantém uma fábrica na China. Como o novo avião será uma derivação do modelo 145, de 50 lugares, sua produção deve ser totalmente asiática. No Brasil não existe mais ferramental nem linhas de produção capazes de suportar essa demanda.

Clientes asiáticos

A fabricante de motores deu início neste ano a sua nova fábrica, em Cingapura, num investimento calculado em US$ 225 milhões. Denominada "instalação do futuro" por sua direção, a unidade de Cingapura será a mais moderna instalação de produção e testes de motores aeronáuticos da Rolls-Royce. Isto faz parte da estratégia de aproximação da empresa de seus clientes asiáticos.

O novo avião da Embraer, ainda sem data para ser lançado, tem como alvos prioritários dos mercados da América do Norte, Europa e Ásia. A estratégia da Embraer iria de encontro com uma mega reformulação proposta em acordos internacionais de alteração em determinados hábitos aeronáuticos que provocam o alto consumo de combustível. Entre eles estão as duas maiores fontes de gastos de combustíveis do setor, a deficiência das rotas e tempo de espera em solo.

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