Villas-Bôas Corrêa, repórter político do JB

Desde a vaia, em quatro tempos, na inauguração do Pan com o Maracanã lotado, o presidente Lula não conseguiu se recuperar do susto, que o pegou distraído como quem escorrega na calçada e passa para o país a preocupante impressão de que está perdido. Ou, para ser mais exato, de quem perdeu o governo e não consegue encontrá-lo por mais que procure pelos cantos e gabinetes do Palácio do Planalto e nos esconsos do Ministério da Defesa, tão extraviado como o patético ministro Waldir Pires.

Ora, cair em si é trambolhão mais perigoso do que despencar do alto da mangueira ao espichar a mão para colher o fruto maduro. Lula claramente não estava preparado para enfrentar a vaia que derrubou, em minutos de assobio, a montagem da falácia gabola do maior presidente de todos os tempos.

Reagiu mal na hora, parecendo sedado para cirurgia de emergência. Nem enfrentou a assuada com serenidade, como risco sempre previsível nos encontros com a multidão ou sequer afirmou a sua autoridade, exigindo o respeito à tradição e ao protocolo e ler a singela frase para declarar inaugurados os Jogos Pan-Americanos. Os quais, para acentuar o seu caiporismo, estão emplacando um sucesso de repercussão mundial, valorizado pelo fantástico desempenho dos atletas brasileiros com a sucessão de recordes e a coleção de medalhas de ouro, prata e bronze.

Em outra circunstância, com o domínio dos nervos e a murcha arrogância devidamente recauchutada, Lula enfrentaria o teste de comparecer à festa de encerramento. É a ocasião única para confirmar se as vaias da inauguração foram orquestradas pela turma do prefeito carioca Cesar Maia ou se a popularidade presidencial necessita de balões de oxigênio para atravessar a fase aziaga do segundo mandato.

Como pondera o governador do Rio Sérgio Cabral, afinado pela clave das desculpas oficiais, a decisão escapista do presidente deve ser respeitada: Lula acha que não há clima para comparecer ao encerramento do Pan, depois do segundo apagão aéreo.

Ora, o homem público deve enfrentar aplausos e vaias com o mesmo respeito às práticas democráticas. Atento a matreirice dos profissionais do ramo que ensina que é mais fácil abafar a estridência da pateada do que o silêncio, pesado como nuvem que anuncia tempestade.

Quem foge da troça acaba não tendo onde se esconder.

Os atribulados primeiros sete meses do segundo mandato, com o fogaréu da crise aérea e as duas tragédias com centenas de vidas, expuseram o governo na evidência da sua fragilidade: na falta de autoridade perplexa diante da seqüência de desafios; na pobreza dos seus quadros; na cumplicidade silente diante das denúncias de corrupção; na barafunda dos 27 ministros e secretários batendo cabeça na Esplanada do obeso Ministério; na falta de um programa para valer e, principalmente, da agenda do presidente que não toca a rotina, delega poderes à chefe do Gabinete Civil, ministra Dilma Rousseff, e não diz coisa com coisa na enxurrada de improvisos da sua vaidade de fluente comunicador.

Lula parece que ainda não se deu conta de que medidas pontuais de indiscutível acerto - como o Bolsa Família, que beneficia mais de 12 milhões de necessitados -, ainda que amparadas pelo louvado desempenho da economia, são paliativos com prazo médio de validade.

E que uma crise como a bagunça do sistema aéreo, com centenas de vítimas, inferniza a vida de milhões expostos às esperas intermináveis nos saguões dos aeroportos. E não atinge só aos ricos e à classe média. Chega à população, infiltra-se na opinião pública com o reconhecimento de que o governo está perdido no caos, muda de planos e projetos a cada dia e já esgotou o repertório dos subterfúgios.

A crise chegou ao fim da linha. Nos três poderes.

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