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Torre alertou: pista estava escorregadia

IPT afirma que não concluiu auditoria técnica sobre a pista principal de Congonhas, só sobre a auxiliar

O Estado de São Paulo

A pista principal do aeroporto de Congonhas estava excessivamente escorregadia, de acordo com diálogos entre controladores de vôo e pilotos. As gravações relatam recomendações da torre de controle de Congonhas para que os pilotos evitassem pousar muito adiante na pista no dia anterior ao acidente com o Airbus da TAM.

O áudio revela que a torre pede a um piloto que 'confirme as condições da pista'. E ouve de volta: 'Continua bem escorregadia'. Há mais um diálogo em que o campo de pouso de Congonhas foi descrito como 'bem escorregadio'. As gravações foram exibidas pela Rede Globo.

Um alerta preventivo na freqüência de rádio dos pilotos chamava a atenção no procedimento de aterrissagem da pista principal antes do acidente. O aviso 'cuidado, pista escorregadia' era transmitido pelos pilotos ao companheiro da aeronave que se preparava para pousar.

A rede de comunicação informal adotada por pilotos para alertar os colegas dos riscos de acidentes na pista escorregadia de Congonhas chegou ao conhecimento ontem da direção do Sindicato Nacional dos Aeronautas. O relato foi feito por pilotos em um espaço reservado para 'denúncias online' no site do sindicato.

O secretário-executivo da Federação de Associações de Controladores de Tráfego Aéreo (Febracta), Ricardo Sterchele, informou que no último domingo dez pilotos reportaram à Torre de Controle de Congonhas que a pista estava escorregadia. 'Domingo foi o primeiro dia de chuva e foi quando a gente teve dez reclamações sobre as condições da pista. E essas informações estão registradas em livro', afirmou o secretário. Sterchele relembrou que em meio à crise aérea, os controladores foram acusados de prejudicar as operações em Congonhas, retardando os vôos, mas que esse acidente teria provado que não é verdade. 'Agora estão vendo que era uma necessidade de segurança', disse.

Os problemas de segurança do aeroporto de Congonhas são velhos conhecidos de especialistas em transportes aéreos e entidades representativas da aviação civil. A constatação dos especialistas consultados ontem pelo Estado aponta para um problema crônico: a falta de uma área de escape para contornar eventuais problemas de derrapagens. 'O aeroporto de Congonhas opera no limite de segurança', afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Pesquisa em Transporte Aéreo (SBTA), Anderson Correia, professor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

Correia destaca que o aeroporto não comporta aviões de grande porte, como os novos modelos de Boeings e Airbus. 'A velocidade de pouso dos modelos de aeronaves de grande porte coloca a questão de segurança no limite, impedindo qualquer erro ou derrapagem no procedimento de pouso. O limite é ainda mais extremo porque não existe nenhuma folga ou área de escape', afirma o presidente da SBTA.

De acordo com normas internacionais, a área de escape deve ter no mínimo 240 metros de comprimento por 480 metros de largura. A pista principal de Congonhas tem 1.900 metros. O aeroporto internacional do Galeão, no Rio, tem a pista principal com 4 mil metros e o aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, com 3.700 metros.

O aeroporto de Congonhas foi construído em um platô artificial instalado no alto de uma colina, contrariando as técnicas construtivas aeroportuárias para que sejam erguidos em planícies. O padrão de engenharia permite que a área de escape seja a continuidade da pista principal, sem obstáculos ou declives que vão parar nas avenidas mais movimentadas da capital paulistana. 'A cidade penetrou no aeroporto, construído na década de 40. O governo federal já deveria ter estudado uma revisão do tráfego de Congonhas', disse.

O comandante aposentado Carlos Camacho, diretor do Sindicato Nacional dos Aeronautas, defende que o tráfego aéreo de Congonhas seja feito exclusivamente por rotas regionais, com duração de no máximo uma hora. 'Seria voltar a sua origem. A ausência da área de escape deveria motivar uma norma para que o aeroporto não funcionasse em dias de chuva, o que na verdade seria um arremedo. O ideal é que as autoridades federais assumam seu compromisso com a sociedade discutindo a capacidade de tráfego de Congonhas sem pressões comerciais.'

Camacho considera que o cumprimento da pista principal de Congonhas não tem condições plenas de segurança para operar com modelos de Boeings 737-800 ou Airbus 320, como o que sofreu o acidente. 'A velocidade de aterrissagem é bem maior do que os modelos antigos de 737-300 ou Fokker100. A derrapagem com o Boeing da BRA em março do ano passado já deveria ter alertado as autoridades.'

CONDIÇÕES DA PISTA

O diretor de programas técnicos da Safety Flight Foundation, fundação internacional de segurança de vôos, James Burin, afirma que mais da metade dos acidentes aéreos ocorre no processo de pouso, e que 60% dessas ocorrências de derrapagem das aeronaves são causadas por má condição da pista, seja molhada, com neve ou gelo.

'Uma lâmina d 'água entre o asfalto e os pneus leva a aeronave a perder o freio', disse. 'A forma de prever é fazer as ranhuras transversais que possibilitem a drenagem da água da pista, os chamados groovings', ressalta. A pista principal de Congonhas foi reaberta há 17 dias, após reformas, mas o grooving ainda não foi feito.

Segundo dados da Safety Flight Foundation, um acidente aéreo com passageiros ocorre a cada 2 milhões de decolagens, o que mantém a aviação comercial entre os mais seguros meios de transporte.

O presidente do Crea (Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura) de São Paulo, José Tadeu Silva, disse ontem que o órgão atestou a regularidade das empresas que reformaram a pista – formada pelo consórcio OAS e Galvão Engenharia, além do registro profissional de responsáveis pelas obras. 'Mas o que está claro é que a obra não estava finalizada. Usar a pista em tempo seco, OK. Mas não durante a chuva. Alguém é responsável por manter a pista aberta em dia chuvoso', disse Silva.

Em nota, o Instituto de Pesquisa Tecnológicas (IPT) afirmou que não concluiu a auditoria técnica sobre a pista principal de Congonhas, apenas sobre a pista auxiliar. Autoridades da Aeronáutica e executivos da TAM utilizam o relatório como sendo o salvo-conduto para o funcionamento das pistas. O IPT foi contratado para fazer auditagem sobre as pistas, conferindo itens como irregularidades da superfície, atrito, mistura de ingredientes da massa asfáltica. O instituto tem prazo até 17 de agosto para entregar o último relatório sobre a situação da pista principal.

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