*Carlos Alberto Sardenberg - O Estado de SP
Quinta-feira, pouco antes das três da tarde, Aeroporto de Foz do Iguaçu, a fila única para o embarque avança lentamente, embora o movimento fosse pequeno. Na chegada à esteira do raio X de bagagens, entende-se por que: só há um equipamento funcionando. Ao lado, porém, há uma outra esteira, parada, com um funcionário ao lado, sem fazer nada.
Estaria quebrada?
Não, responde a funcionária que está operando a primeira esteira, "aquela outra é para voos internacionais".
De fato, há voos internacionais previstos para o dia, mas não naquele momento. Por que não liberam a segunda esteira?
Ora, porque se aguarda o embarque internacional, respondem os funcionários, como se a pergunta fosse idiota.
Foz do Iguaçu é um centro turístico internacional. A sociedade local está mobilizada para colocar as cataratas entre as sete maravilhas naturais do mundo, num concurso global pela internet. É boa a chance de ganhar, mas como seguir com aquele aeroporto?
A sociedade também está empenhada nisso. Com o apoio de empresas e organizações civis, prepara-se um projeto completo para um novo aeroporto, da engenharia ao financiamento, que será oferecido à Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero).
Oferecido como? Para a Infraero fazer ou para autorizar a iniciativa privada a construí-lo?
Pois é, essa é a dificuldade, explicam executivos envolvidos na história. Eles não acreditam que a estatal tenha condições - administrativas, gerencias e financeiras - de tocar o novo projeto. A concessão (a privatização) seria a saída, mas aí enrosca. "O pessoal da Infraero não gosta quando a gente fala em concessão privada", comenta um dos promotores do projeto.
Ou seja, vai continuar com uma esteira só.
Comentei o assunto na rádio CBN e o ouvinte Ângelo Cavallante contou que, quando há voo internacional, a situação é pior ainda: "O aeroporto não tem nem ar-condicionado, apenas uns ventiladores horríveis. Estive lá há uma semana, num voo para Lima, e só tinha uma pessoa no balcão da Polícia Federal para checar os passaportes. Formou-se uma imensa fila única, que não andava, tive vergonha de ser brasileiro. Um funcionário da empresa aérea disse-me que é uma loucura trabalhar em temporada de férias e que não quer estar lá na época da Copa".
Em São José dos Campos há uma situação parecida. O aeroporto é ridículo. Empresas, sociedade e prefeitura se mobilizaram e montaram um projeto para a reforma, incluindo o dinheiro. Mas faz anos que o pessoal não consegue encaminhar o projeto com a Infraero.
O governo Dilma resolveu conceder à iniciativa privada a reforma e a administração dos aeroportos de Cumbica, Viracopos, Brasília, Galeão e Confins. É uma confissão de que o governo não tem nem os recursos financeiros nem a capacidade de tocar a modernização daqueles aeroportos, essenciais não para a Copa do Mundo de 2014 ou a Olimpíada de 2016, mas para o funcionamento do País.
A ideia de privatização é antiga, mas ficou parada por restrições ideológicas. Agora saiu, por necessidade.
Mas saiu algo envergonhada. Começa que o governo vai exigir que os concessionários privados tenham a Infraero como sócia, com 49% do negócio. O pessoal do setor privado ainda está estudando, mas podemos imaginar: por que topar um sócio público que não vai entrar com dinheiro, mas com uma suposta expertise que o mercado conhece bem?
Por outro lado, a situação evidencia que há dezenas de outros aeroportos em cidades médias para os quais a Infraero não dispõe de recursos suficientes. Ora, por que não concedê-los também, sabendo-se que há interesse e recursos privados já até mobilizados, como são os casos de Foz do Iguaçu e de São José dos Campos? Já que quebraram o tabu, por que não lançam um amplo programa de privatização de aeroportos?
Resposta simples: o tabu ideológico não foi quebrado de fato.
Fontes de São José dos Campos contaram que o pessoal da Infraero alega dificuldades legais e burocráticas para fazer algum tipo de acordo que permita a utilização de dinheiro privado ou da prefeitura nas obras do aeroporto. Dizem, também, que não têm instrumentos para fazer concessões. Mas alegam isso faz muito tempo.
Tudo considerado, parece que a decisão de fazer as concessões, embora tomada pela presidente Dilma Rousseff, continua sofrendo restrições dentro do governo. E sabe-se o que acontece quando a burocracia quer segurar alguma coisa.
"Custo mundo". É caro produzir qualquer coisa no Brasil, inclusive automóveis. O custo Brasil está na carga tributária, na taxa de juros (custo de capital de toda a cadeia produtiva e distribuidora), nas legislações (incluindo a trabalhista) e no ambiente de negócios (como o custo altíssimo de manter em dia o pagamento dos impostos caros).
Em cima disso tudo cai o real valorizado.
Como não consegue reduzir os componentes do custo Brasil, o governo resolveu aumentar o "custo mundo", na feliz expressão do jornalista William Waack, do Jornal da Globo. Aumentou o imposto sobre carros importados, com um sistema que atinge especialmente os veículos chineses e coreanos.
*JORNALISTA