Estado deve notificar Infraero hoje sobre licenças do Santos Dumont, o que pode atrasar em um ano abertura a novas rotas
Bruno Villas Bôas, Bruno Rosa, Geralda Doca e Bernardo Mello Franco
RIO e BRASÍLIA. Um dia após classificar de deboche a decisão da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) de liberar voos regionais no Aeroporto Santos Dumont, o governador do Rio, Sérgio Cabral, mudou ontem o tom do discurso e admitiu conversar com a agência sobre a liberação de voos para alguns destinos. Nos bastidores, no entanto, o governo prepara um plano de guerra. O Instituto Estadual do Ambiente (Inea, que substituiu a Feema) deve notificar hoje a Infraero sobre a licença ambiental do Santos Dumont, que venceu há um ano. Também informará que a licença prévia do aeroporto - primeiro passo da licença ambiental - vale apenas para voos no eixo Rio-São Paulo. Para outros destinos, será necessário novo estudo de impacto ambiental e audiência pública, processo que atrasaria em um ano a abertura do terminal.
O governador se reuniu ontem com secretários para discutir medidas contra a decisão. Além da frente ambiental, foi debatido o aumento do ICMS sobre querosene de aviação no Santos Dumont (de 4% para 18%) e uma possível ação judicial. Mais tarde, em tom mais ameno, Cabral afirmou que gostaria que a agência abrisse voos regionais no aeroporto, desde que excluídos os grandes centros urbanos.
- É evidente que a minha posição é até impopular. Para o cidadão do Rio, é muito mais confortável pousar no Santos Dumont. Só que isso vai destruir a malha doméstica de conexão dos voos internacionais do Galeão - afirmou Cabral.
A Anac não comentou oficialmente as represálias. Segundo um técnico, as medidas foram consideradas descabidas e sem amparo legal. O aumento do ICMS sobre o querosene, por exemplo, afetaria todas as aéreas que operam no aeroporto.
- Também não haverá limitações nas novas autorizações de voo no Santos Dumont. Serão aprovados voos para grandes centros urbanos - disse.
O governo teme que a abertura do Santos Dumont esvazie o Galeão, em privatização para a Copa do Mundo de 2014 e uma eventual escolha do Rio como sede das Olimpíadas de 2016. Segundo a secretaria de Transportes, o Galeão vai perder 3,65 milhões de passageiros por ano com a abertura do Santos Dumont. Um estudo da Anac contraria isso, mostrando que apenas 1,1% dos passageiros internacionais fazem conexão, e que o aeroporto não será afetado.
Ontem, o prefeito Eduardo Paes classificou a decisão da Anac de "absurda e escandalosa". Para ele, a medida vai esvaziar o Galeão. Paes avalia medidas judiciais em conjunto com o governo do estado.
Anac recebe das empresas pedidos de voos regionais
A decisão da Anac será publicada hoje no Diário Oficial. Também hoje as empresas aéreas se reúnem com a Anac, no Rio, para entrega dos pedidos de voos. Em janeiro, TAM, Gol, OceanAir e Webjet solicitaram à agência 47 pedidos de voos, principalmente para Pampulha (BH) e Brasília. Já a Azul pretende lançar cinco frequências diárias para Campinas (SP). Na terça-feira, Cabral culpou a empresa pela abertura do aeroporto e chamou seu dono, David Neeleman, de "gringo e lobista". Pedro Janot, presidente da Azul, lamentou as declarações.
- Ficamos tristes, muito tristes, com esse ato xenófobo e preconceituoso - disse.
A guerra aberta nos céus do Rio dividiu especialistas em concorrência. A polêmica também chegou ao Congresso. A Comissão de Turismo e Desporto da Câmara quer convocar dirigentes da agência e das principais companhias aéreas para discutir o assunto em audiência pública nas próximas semanas.
Ex-presidente do Cade, Ruy Coutinho diz que as restrições violavam a Lei Antitruste, que estabelece regras da livre concorrência. Para ele, as restrições favoreciam o duopólio de TAM e Gol/Varig, e a abertura vai reduzir preços. Já o especialista Respício do Espírito Santo, da UFRJ, afirmou que não há garantias de queda dos preços.